Dividendos são só espuma

Aprendi essa semana que a espuma do detergente não faz a louça ficar mais limpa. Apesar da sensação satisfatória de ver as bolhas se formando e a sujeira indo embora junto com a espuma ao enxaguar, não é propriamente a ela que limpa. A espuma é um sinal de que colocamos o sabão e de que podemos esperar que depois do enxágue, a louça estará limpa.

Os químicos experimentam cuidadosamente qual a quantidade de espuma ideal para que ela não piore a capacidade do sabão de limpar a louça. Os detergentes poderiam fazer menos espuma e, assim, seriam até mais eficientes. No entanto, os consumidores estão acostumados a ver as bolhas se formando e a senti-las em suas mãos, como um sinal de que a lavagem está funcionando. É surpreendente que alguém piore seu próprio produto apenas para nos dar alguns segundos de satisfação das nossas expectativas sensoriais. Você preferiria usar um detergente que lava melhor, mesmo que ele te desse uma sensação de que está lavando com pouco sabão e de que você está fazendo um esforço inútil?

Espuma demais

Para os investidores, os dividendos são só espuma. Receber um pouco de dividendos quando você investe é normal, como ter um pouco de espuma na sua louça. No entanto, a fixação em receber percentuais altíssimos do seu patrimônio como dividendos é o mesmo que querer cada vez mais bolhas na lavagem. Uma hora, essa espuma toda vai atrapalhar.

Não há nada de mágico em dividendos. As empresas pegam dinheiro do caixa e pagam a seus acionistas. Antes você tinha ações de uma empresa que tinha dinheiro em caixa, depois passou a ter ações de uma empresa com menos caixa e dinheiro na sua conta. É como tirar dinheiro do bolso esquerdo e colocar no direito. O dono da padaria não ficou rico quando tirou o dinheiro do caixa da padaria e colocou na sua conta pessoal. Ele enriqueceu quando a padaria vendeu seus pães.

Empresas que pagam muitos dividendos, em geral, estão maduras, no fim de sua vida útil, passaram por um ciclo de mercado favorável, ou tem controladores precisando de dinheiro em caixa. Os dividendos altos impedem novos investimentos e, então, a bonança acaba, a vida útil da empresa chega ao fim, os preços cíclicos caem e os dividendos secam. Claro que pode demorar anos para a empresa reconhecer que não consegue manter os dividendos, pois ela pode até mesmo fazer dívidas para continuar pagando dividendos gordos aos acionistas. Se não há lucros crescentes para distribuir, uma hora os dividendos acabam.

O vício em dividendos

Quando começamos a investir em ações, desejamos receber os primeiros dividendos. Você recebe a notificação ali no celular: pingou na conta! É viciante até. Assim como a espuma, eles são um sinal de que o que estamos fazendo vai ter resultado, mas, em excesso, vão piorar os seus resultados.

Investir com foco exagerado em dividendos aumenta os riscos da sua carteira sem melhorar a relação de risco e retorno. Para aumentar os recebimentos, você aumenta a concentração da sua carteira e se expõe mais a riscos individuais de empresas ou setores. Aceitar ter empresas se endividando excessivamente para manter a distribuição de dividendos aos acionistas. Deixa de fora empresas que podem ser tão ou mais conservadoras, mas que decidiram manter dinheiro em caixa, ou fazer alguns investimentos, sendo que estas poderiam te dar mais segurança e diversificação.

Pode ser difícil perceber que você pode vender parte de sua carteira para obter renda mensal, sem depender da distribuição de dividendos, e mais difícil ainda saber o quanto você pode vender. Você pode sentir que está retirando mais do que sua carteira pode aguentar sem prejudicar o seu futuro. Se este for o seu caso, minha consultoria de investimentos pode ser para você.

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